Ponto de Vista: a cassação do registro, do diploma, ou do mandato pelo uso do poder político e econômico

No próximo ano teremos eleições municipais. É essencial que os prefeitos municipais, como detentores do poder, que pretendem disputar a reeleição, ou que resolvam apoiar algum candidato à sua sucessão, atuem com muita cautela, assim como os vereadores que queiram retornar à Câmara, ou os novos que desejam conquistar um espaço no legislativo municipal com o voto do povo. 
 
É preciso que alertemos aos prefeitos, vice-prefeitos e a todos os candidatos das mais diferentes matizes políticas e partidárias,  que se acautelem antes e durante do período eleitoral para que não sejam surpreendidos com ações que possam resultar em anulação de registros de candidaturas, invalidade de diplomas eleitorais ou mesmo na pena capital da perda de mandato eletivo. 
 
É aconselhável uma leitura mais atenta aos dispositivos constantes da Constituição Federal (art. 14), Código Eleitoral (art. 334), Decreto-lei 201/67, Lei das Eleições (lei nº 9.504/97) , a LC nº 64/90, e às resoluções baixadas pelo TSE antes da corrida eleitoral.
 
Há quem se engane ao pensar que as proibições que causam inelegibilidade, perda de mandato ou nulidade do diploma apenas acontecem após o cometimento de uma ilicitude durante o período em que se desenrola a eleição.  
 
Há que se observar as condutas vedadas durante os três meses anteriores às eleições. Mas, no entanto,  existem práticas mesmo antes desse período a ensejar abusos rechaçados pela Justiça Eleitoral, com base em representação quer dos partidos ou coligações ou do Ministério Público Eleitoral. 
 
Desde o primeiro dia do ano da eleição é preciso evitar abusos ou excessos, notadamente de quem tem muito dinheiro e acha que pode fazer tudo sem limites, ou de quem detém o poder e não segue as regras do bom senso. 
 
Na verdade, todas as provas de desatinos ou excessos sem que o candidato se dê conta, podem  estar sendo colhidas no período que antecede ao registro de candidaturas, na fase pré-eleitoral, para pedir a sua anulação, ou mesmo naquele período desde a convenção, passando pela eleição, e aguardando a diplomação, para impugná-lo.
 
Tudo aquilo que possa caracterizar uso indevido da máquina, do poder econômico ou político, acarretando a desigualdade entre os concorrentes, pode ocasionar uma ação na Justiça Eleitoral. É preciso muito cuidado. 
 
Alguns atos cometidos fora das regras normais de uma eleição, divulgados nas redes sociais pelo próprio candidato, cuja proibição esteja contida na  jurisprudência do TSE ou nas leis eleitorais, a exemplo de uma foto, um vídeo ou áudio, estampando uma ilegalidade, uma propaganda antecipada, podem causar um baque irreversível a uma candidatura que se deixou expor a tais descuidos. 
 
Muita gente confunde benefício direto à população, quando se insiste na repetição, sem o menor freio ou comedimento na prática de um ato de poder por várias vezes, não com a intenção mascarada de bem servir à comunidade, mas com com a intenção premeditada de soerguer um candidato que se encontra no governo, mostrando desse jeito, que é o melhor, ainda que aproveitando-se de um cargo público.
 
Um  benefício direto ou indireto em favor de um candidato que atua acima dos limites da lei, com a aparência de que está agindo de acordo com os deveres de seu cargo, tem a sua ação contaminada pelo germe do poder imoderado e desproporcional, comprometendo a normalidade da disputa eleitoral que deve acontecer em observância ao princípio da paridade de armas.
 
O detentor de mandato eletivo deve atentar para a responsabilidade de uma delegação que lhe é dada pelos eleitores para que  trabalhe indistintamente em benefício de todos,  e não usar dessa delegação para para manter-se no poder a qualquer preço.
 
O Ministério Público, o candidato, o partido político ou a coligação, podem valer-se da AIJE (Ação de Investigação Eleitoral), têm legitimidade para tanto, e podem fazer uma representação ao Juiz Eleitoral (no caso de eleição municipal), pedindo a abertura de processo de investigação apontando provas de abuso de poder econômico e/ou político.
 
 A data do início da AIJE é a data do registro do candidato, encerrando-se no dia da diplomação. 
 
Após a diplomação a AIJE não pode ser mais ajuizada. 
 
Resta a AIME (Ação de Impugnação de Mandato Eletivo). 
 
A AIME permite que o mandato do candidato eleito possa ser impugnado perante a Justiça Eleitoral em até 15 dias após a diplomação. O objetivo é barrar o político que obteve o cargo por meio de abuso de poder econômico, corrupção ou fraude.  Se for julgada procedente, o Tribunal pode, de acordo com o caso concreto, declarar a inelegibilidade do representado e, ainda, cassar o registro ou o diploma do candidato. A AME pode ser apresentada pelos mesmos autores da AIJE 
 
Qual a diferença entre abuso do poder político e econômico? 
 
Na verdade não existe uma definição sobre o que significa abuso do poder econômico ou político na legislação eleitoral. Mas a doutrina e a jurisprudência do TSE, procuram suprir essa omissão,  explicando as razões que causam a nulidade do registro, do diploma ou perda de mandato e inelegibilidade  pela ocorrência dessas ilicitudes. 
 

Abuso do Poder Político

 
De acordo com o TSE o abuso do poder político resta confirmado quando “o agente público, valendo-se de sua condição funcional, e em manifesto desvio de finalidade compromete a igualdade da disputa e a legitimidade do pleito em benefício de sua candidatura ou de terceiros “(Rec Ord 172365).
 
Já é jurisprudência pacífica no TSE: “para a confirmação do ato abusivo, não será considerada a potencialidade de o fato alterar o resultado mas apenas a gravidade das circunstâncias que o caracterizam”.
 
Isso significa o seguinte: o que importa para a Justiça Eleitoral, é a repetição abusiva do ato, o excesso da ação de quem governa para desequilibrar o pleito e promover a desigualdade na disputa, ou a reiterada prática do abuso da função de gestão que aparentemente se apresente boa para o povo, porém crivada de segundas intenções para beneficiar a sua candidatura ou a de terceiros para os quais ele publicamente tenha manifestado seu apoio. 
 
O TSE procura dizer que é a gravidade do ato contra a legitimidade das eleições que se deve levar em conta, e não o resultado do pleito, por maior que tenha sido a diferença, ou o resultado. 
 
O bens jurídicos tutelados são o livre exercício do voto popular e a legitimidade do processo democrático. Quem, no poder atentar contra esses valores, usando da caneta para se beneficiar ou a terceiros que queira eleger, cometendo excessos ou exageros, incorrerá na prática de abuso de poder político.
 
Ainda, segundo o TSE, o vocábulo  corrupção constitui gênero do abuso de poder político e deve ser interdito em seu significado coloquial, albergando condutas que atentem contra a normalidade e o equilíbrio do pleito ((REsp nº 73646/2016, min. relator Antônio Hermann de Vasconcelos). 
 
ATENÇÃO: Para o TSE todo gestor que abusa do poder político, pratica um ato de corrupção. 
 
Abuso do Poder Econômico 
 
 
Pode-se afirmar que há abuso de poder econômico quando ocorre doação de bens ou de vantagens a eleitores de forma que essa ação possa desequilibrar a disputa eleitoral e influenciar no resultado das eleições, afetando a legitimidade e normalidade das eleições. Para o TSE, o abuso do poder econômico é a utilização, em benefício eleitoral de candidato, de recursos patrimoniais em excesso. 
 
(…)1. O abuso de poder econômico concretiza-se com o mau uso de recursos patrimoniais, exorbitando os limites legais, de modo a desequilibrar o pleito em favor dos candidatos beneficiários. (Rel. Min. Arnaldo Versiani, RO 1.472/PE, DJ de 1o.2.2008; Rel. Min. Ayres Britto, RESPE 28.387, DJ de 20.4.2007).
 
O uso abusivo, desde que provado dos meios de comunicação, como o rádio e a TV, que são concessões públicas, podem redundar em abuso do poder econômico. 
 
O aproveitamento da religião nos pleitos eleitorais, como meio de impulsionar candidatos eletivos tem sido considerado pelo TSE como abuso de poder econômico, podendo causar o indeferimento do registro em investigação eleitoral, ou anulação do diploma em ação de impugnação de mandato eletivo.
 
Pretendo com este artigo oferecer aos candidatos de todos os partidos a minha modesta contribuição como ex-parlamentar e atualmente atuando na advocacia, com vistas à normalidade do pleito eleitoral do próximo ano, que servirá, com a prática democrática consciente e democrática, para a concretização de muitos sonhos de todos aqueles resolveram ingressar na militância da bela e monumental carreira política
 
ACV