SER OPOSIÇÃO OU BANDEAR-SE PARA O GOVERNO?

É MELHOR SER GOVERNO OU SER OPOSIÇÃO?

Muitos nem querem responder a essa pergunta, porque nasceram governo, continuam no conforto do governo, e consideram um despropósito, ou até mesmo uma loucura, marchar do lado da oposição, onde nunca estiveram. 

Outros com o silêncio oportunista, ou com justificativas vergonhosas para aderir, já responderam à pergunta estampada neste artigo. 

Num domingo, depois de tomar um café no Conjunto Augusto Franco, encontrei-me por acaso com um cidadão que me cumprimentou e falou que me admirava como político, mas que não votou em meu nome para o Senado porque fui candidato fazendo oposição ao governo.

“Eu tenho uma teoria – disse ele – “ser governo é ter uma atitude prática e consciente de que não se deve nadar contra a maré.” Continuou falando e eu só escutando: – “Nunca perdi o meu voto numa eleição porque só fico do lado de quem vai ganhar …”

O homem despontou no local, de repente, como se estivesse falando para uma grande plateia a ouvir a sua explanação,  expressando-se com ar professoral, e eu, ali em pé, ouvindo-o pacientemente, com vontade de sair, é verdade, mas que, apenas por educação permanecia parado no mesmo lugar.

Na sua peroração, de um modo simples e franco, o homem falou-me sem meias palavras; –  “o governo é lugar para crescimento social e econômico, enquanto lutar pela oposição só traz gastança, sacrifício e sofrimento”.

UM DEFENSOR E PROPAGADOR DA TEORIA GOVERNISTA

E para confirmar a sua tese, ou melhor dizendo, a sua teoria governista:  “No governo só quem está no comando é que tem que se virar pra arranjar dinheiro e fazer a máquina seguir em frente. Para nós apoiadores o único esforço é saber como colher a melhor vantagem”. 

E prosseguiu no seu lenga-lenga: “No governo, se você é empresário e resolver ser candidato, ganha duas vezes caso seja eleito, dividendos políticos com o cargo e lucros nos seus negócios, pela facilidade de penetrar na máquina”.

Ainda não satisfeito, me pegando  pelo braço, para impedir, jeitosamente, a minha retirada (nessa altura já se formava um grupo de curiosos), disse-me: – “Aqui na terrinha, seu Valadares, quem não é governo tá chegando, quem não chegou ainda, tá doido pra chegar. A oposição devia entender que ela só sabe falar, nada faz. E só quem pode reunir, e quem de fato faz, é o nosso governo!”.

“Portanto – continuou aquele doutrinador -, “ser oposição é um ato impensado, uma atitude burra e inconsequente. Contrariar o governo em qualquer lugar, na mídia, nos partidos ou no legislativo, é algo perigoso que pode render sérios prejuízos”.  “Cito como exemplo a classe hoteleira”, – fez questão de lembrar: – “mesmo no prejuízo porque não chegam hóspedes nos seus hotéis, por omissão dos órgãos de turismo, ficam mudos e calados apesar da queda em seus lucros, porque são inteligentes, sabem que esperando mais um pouquinho o nosso governo vai consertar o setor e resolver”. “Eles estão mais do que certos, esbravejou o homem: – “Em boca fechada não entra mosquito …”

MÁQUNA DO GOVERNO, DESENGONÇADA MAS EFICIENTE

“A máquina do governo, por mais velha e desengonçada que seja, pelo próprio desejo de proteção do poder e de vingança pode enterrar seus projetos políticos ou econômicos, e reduzir a quase zero a sua capacidade de reagir”,  profetizou aquele homem. 

E, a seguir me fez essa indagação: “Na nossa terrinha você já viu algum empresário que seja candidato perder uma eleição e quebrar no governo?” Daí ele mesmo se apressou em responder : – “Não vi, pelo contrário melhorou em tudo…”.

Foi quando ele soltou o meu braço, aproveitei o seu vacilo para dar-lhe um até logo e desvencilhar-me o quanto antes daquele papo que estava me cansando e que poderia durar muitas horas.  Entrei ligeiro no meu Fiat Grazie Mille, abri o word no computador quando cheguei em minha casa, e escrevi esse artigo modesto que só agora publico. 

A teoria governista defendida tão cinicamente por aquele cidadão, se por ventura chegasse às escolas como ensinamento para os nossos jovens seria como um enterro da nossa democracia.

Agora eu fico conversando com os meus botões:  se essa teoria absurda está disseminada em nosso meio e morando na cabeça de muitas pessoas, não há como eu desistir da política enquanto permanecer essa tendência ardilosa e devastadora de querer o poder, não como meio de distribuir benefícios para todos, e, sim como um instrumento de garantias de  vantagens para uma casta minoritária que melhora de vida sugando impiedosamente do governo que, querendo ou não, legitima seus ganhos. 

Com serenidade e destemor, cada um de nós no campo da oposição, por maior que seja a desigualdade dessa luta, haveremos de mostrar que a única teoria que um dia vencerá é a da verdade  contra a mentira.

O marketing da enganação, e os interesses privados que nunca deveriam misturar-se com a política um dia merecerão a devida resposta. 

“Água mole em pedra dura tanto bate até que fura”.

ACV