RETALHOS DA POLÍTICA -NOS TEMPOS DA SUCESSÃO

NA ESCOLHA DO VICE, UM ABAIXO ASSINADO

A escolha do nome do Vice-governador de João Alves teve lances inusitados que merecem ser contados. Não se trata de aproveitar essas mal traçadas linhas para reclamar ou fazer queixas porque simplesmente, em dado momento, meu nome já não fora aproveitado para governador, e, para Vice, passei a ser uma hipótese longínqua. 

Ou seja, rifado para ser candidato a governador, cheguei a perder todas as chances de ganhar uma Vice. Por fatos aleatórios à minha vontade, acabei sendo colocado de novo   no tabuleiro da sucessão quando já me consideravam totalmente fora do processo. 

É o que vou contar a seguir. 

Depois do anúncio de João Alves como candidato à sucessão de Augusto Franco, e de Albano Franco para o Senado da República, teve prosseguimento o trabalho de bastidores no qual participava ativamente, dentro de um seleto grupo de políticos, o general Djenal Queiroz, Vice-governador de Augusto Franco. 

Dentro de pouco tempo, com o afastamento de  doutor Augusto do Governo para disputar uma vaga de deputado federal, ele seria guindado ao comando do Estado. Djenal Queiroz, militar da reserva do exército brasileiro,  era um prócer do antigo PSD, que fora presidente da Assembléia Legislativa, e um deputado de muito respeito. 

Juntos fomos deputados estaduais, e nos entendíamos maravilhosamente. Inclusive, recordo que, como o Regimento da Assembléia estava bastante defasado, fui escalado pelo presidente Djenal para elaborar um projeto de resolução e atualizá-lo.

Frequentemente, discutíamos as mudanças que tinham que  ser feitas nas regras daquele diploma legal que ditava o funcionamento da Casa.  Djenal, por ser o mais idoso e o mais experiente, era ouvido e acatado por todos. Exercera a função de líder do governo José Rollemberg Leite, sucedendo-me quando fui eleito no seu lugar para a presidência do Poder Legislativo.

O general tinha o Regimento Interno da Casa gravado em sua memória. Discutia no plenário com a oposição e levava quase sempre vantagem na derrubada de requerimentos incômodos contra o governo, convencendo à Mesa sobre as ilegalidades cometidas por seus autores.

Mas, tanto nas discussões de cúpula para a indicação do sucessor de Augusto Franco, como por ocasião da escolha do Vice de João Alves, Djenal opinava em particular em meu desfavor, sem nunca, porém, expor-se publicamente. No entanto, passado aquele tempo  de distanciamento, voltamos à velha amizade, sem quaisquer resquícios de mágoa. 

Logo  depois da decisão de cúpula que favoreceu a João Alves, tomei conhecimento de que uma lista de apoio estava percorrendo todo o Estado, para que lideranças do interior confirmassem aquela escolha, assinando o documento.  Levava a referida lista para a coleta das assinaturas  um amigo pessoal do doutor Augusto, Elber Ribeiro, que fora presidente da Assembléia Legislativa. 

 NA LISTA, GOVERNADOR SEM VICE

A mencionada lista trazia o nome completo do candidato a governador, contudo, curiosamente, omitia o nome daquele que seria o Vice de João Alves. Foi então que a famosa lista,  uma espécie de abaixo assinado, que já dispunha de algumas assinaturas de apoiamento, empacou na cidade de Itabaiana nas mãos do deputado estadual Francisco Teles de Mendonça,  conhecido pela alcunha de Chico de Miguel, a maior força eleitoral de todo o interior de Sergipe.  Eu havia sido o seu candidato a deputado federal nas eleições de 1978.

Abro um parêntese, antes de continuar este meu relato. Nesse intermédio, registro que concedi uma entrevista muito forte ao jornalista Diógenes Brayner que teve muita repercussão em todo o Estado, na qual fiz questão de demonstrar claramente o meu inconformismo da forma como estava sendo encaminhado o processo sucessório. Até então não havia  participado de nenhuma reunião para discutir o tema da sucessão,  cujo desfecho, eu tinha plena consciência  de que iria repercutir na minha carreira política, e na de tantos amigos que nos acompanhavam. Na hora da entrevista eu ainda nem sabia sobre o que estava acontecendo em Itabaiana. 

A REAÇÃO DE CHICO DE MIGUEL, LÍDER POLÍTICO DE ITABAIANA

Informaram a Chico de Miguel que o nome do Vice, até então oculto, seria o do deputado estadual Hélio Dantas, aliado de primeira hora do movimento em prol da candidatura de João Alves, filho do combativo e temido jornalista  Orlando Dantas, o qual, divulgara em seu jornal ataques tremendos contra Chico de Miguel.

O deputado itabaianense, ciente de sua força,  estava irredutível, e achava que era o momento de dar o troco. Então, Elber Ribeiro,  perguntou-lhe o porquê de não assinar a lista do governo, e Chico de Miguel não bateu fofo. Disse-lhe que o Palácio estava-lhe preparando uma armação para a indicação do Vice-governador, que recairia na pessoa de Hélio Dantas, filho de Orlando Dantas, o qual  se tornara seu inimigo público número um, na cidade de Aracaju.  E, em cima da bucha, falou-lhe:  “Eu tinha certeza que o nome do Vice seria o de Valadares, por que não botar aqui nesta lista o nome dele?”.  Elber Ribeiro pediu-lhe então pra ligar para o governador, já que ele não dispunha dessa autorização. 

Ao passar-lhe o telefone, o governador Augusto Franco,  ouviu de Chico que só colocava sua assinatura no abaixo assinado,  apoiando João Alves, se o Vice fosse o deputado federal Antonio Carlos Valadares. 

Chateado com os rumos da sucessão, ameaçou apoiar uma chapa alternativa com Valadares na cabeça da chapa majoritária. Mesmo arriscando tudo, estava decidido a se rebelar e enfrentar o governo. Para tanto, disse que contaria com o apoio de diversas lideranças, a exemplo de Ribeirinho de Lagarto, os irmãos Rollemberg (deputado federal Francisco e ex-prefeito Heráclito Rollemberg), e de outros líderes municipais que obedeciam à sua voz de comando.

Podia ser um blefe ou uma bravata  mas o fato é que os homens da cúpula do governo preferiram não testar.

Após Chico extravasar suas queixas contra o governo, que, em algumas vezes,  não atendera pleitos que fizera em benefício de municípios sob sua influência,  houve uma pausa para consultas. Elber ficou à espera de uma solução, sentado, na casa de Chico de Miguel. 

Veio a resposta de que na lista de apoio Elber Ribeiro podia colocar o nome de Antonio Carlos Valadares como Vice de João Alves.

Contudo, quando se esperava que as coisas estavam resolvidas, Chico, antes de assinar, exigiu que todos aqueles pedidos feitos por ele, e negados por doutor Augusto,  fossem imediatamente autorizados. Os pedidos diziam respeito a espaços de poder nos municípios que o Estado deixara, com o consentimento do governador, nas mãos de adversários políticos de Chico de Miguel.  Foi-lhe então dito que tudo seria resolvido. Como nunca ouvi de Chico qualquer reclamação a respeito, tenho como certo de que todas as suas pendências perante o governo foram rigorosamente atendidas …

Chico de Miguel tinha um prestígio eleitoral inegável. Por isso, era temido por aqueles que detinham o poder em Sergipe. 

O VICE APARECE NA ATA, SEM TER COMPARECIDO

Comecei a entender que a minha teimosia em manter a candidatura de José Valadares para Deputado Estadual, cuja retirada me havia sido sugerida pelo governador, estava criando obstáculos a composições políticas. Doutor Augusto, com certeza,  teria feito alguns compromissos contando com os votos de Simão Dias e dos municípios que acompanhariam Zé Valadares. Por isso que, insistiu o quanto pôde, e eu resolvi não atendê-lo. Aquilo deve ter resultado numa ponta de mágoa. 

Mas eu não podia recuar, uma vez que José Valadares fora muito correto comigo no início da minha carreira, quando, ao me afastar da Prefeitura de Simão Dias para ser candidato a Deputado Estadual, ele que era Deputado, renunciou o seu retorno natural à Assembléia Legislativa para me apoiar.

Mesmo sob o risco de ser prejudicado eu não faria isso com quem tanto me ajudara. O meu dever de gratidão falava mais alto. Mesmo sob o risco de contrariar o governador insisti na sua candidatura.

Quando soube das tratativas que resultaram na inclusão de meu nome compondo a chapa de João Alves da forma inusitada e antiquada como tudo acontecera, sem nenhum convite formal,  seja da parte de doutor Augusto Franco, ou do candidato a governador João Alves Filho, no dia da convenção não compareci à homologação da chapa majoritária. “Desapareci” de Aracaju. Ninguém conseguia falar comigo. Os telefones tocavam insistentemente em minha casa. A ordem era para informar que eu tinha viajado. Dormir até o dia seguinte. Quando acordei, soube que o meu nome constava na chapa majoritária do partido, na condição de Vice-governador. 

PARA ALMA CHAMUSCADA –  CALMA, PACIÊNCIA  E HUMILDADE 

Confesso que sai daquela fase de minha carreira política com a alma chamuscada pela voracidade dos acontecimentos que me pegaram de surpresa, e sobre os quais não tive força para controlá-los. Felizmente tive calma, humildade e paciência para entender tudo aquilo, e navegar sem mágoas. Não fosse assim, por certo, teria um destino diferente daquele que consegui alcançar nas minhas lutas políticas. 

Pela experiência que vivi naqueles lances que fazem parte de nossa história política,  terminei aprendendo a singrar por mares tempestuosos que eu julgava não  pudesse navegar. 

Vencendo a intolerância e os ataques injustos que foram desferidos contra mim toda vez que o meu nome surgia na disputa democrática das eleições,  guardo do povo eterna  gratidão, e também de quantos, me ajudaram –  ao filho de um  plantador de algodão, nascido num povoado de Simão Dias -, a chegar a cargos tão importantes do estrelato da política sem jamais chamuscar a minha honra e a sagrada bandeira do meu Sergipe.

Navegar é preciso, mas,  “faça como um velho marinheiro, que durante o nevoeiro, leva o barco devagar”. Argumento, de Paulinho da Viola. 

ACV

Síntese do resultado das eleições de 1982:

  • 1º colocado para governador: João Alves Filho (PDS) – 256.385 votos (76,12%)
  • 2º colocado para governador : Gilvan Rocha  (PMDB) – 77.420 votos (23,15%)
  • 1º colocado para senador : Albano Franco (PDS) – 247.255 votos  (76,18%)
  • 2º colocado para senador : Evaldo Campos (PMDB) – 74.874 votos(23,07%)

           Deputados federais eleitos pelo PDS   (governo): 

  • Augusto Franco – 102.006 votos
  • Francisco Rollemberg – 46.128 votos
  • Hélio Dantas – 28.142 votos
  • Gilton Garcia – 27.5550 votos
  • Celso de Carvalho – 22.841 votos
  • Adroaldo Campos – 11.745 votos

          Deputados Federais eleitos pelo PMDB (oposição):

  • José Carlos Teixeira – 30.968 votos
  • Jackson Barreto – 19.992 votos