INTIME-SE VIRGULINO FERREIRA, VULGO LAMPIÃO, MANDA JUIZ SERGIPANO

JUIZ MANDOU E OFICIAL DE JUSTIÇA FOI PROCURAR LAMPIÃO 

Foi um ato de coragem mandar intimar o temido cangaceiro.

Consta que a Justiça deu início a um processo criminal contra Lampião, o “Rei do Cangaço”,  e queria colocá-lo atrás das grades, ali por volta de 1931.

O crime cometido por Lampião, pelo qual a Justiça queria puni-lo tinha acontecido no Sítio Acenço, hoje povoado de Nossa Senhora das Dores.  

O Juiz que mandou lavrar o termo de intimação para trazer Lampião à sua presença e fazê-lo sentir o peso da lei, chamava-se Dr Nicanor Menezes de Leal, da Comarca de Capela,  cuja  jurisdição alcançava Nossa Senhora das Dores, termo que era daquela comarca. 

O DEVER DE UM JUIZ SOBREPÕE-SE AO MEDO 

De fato, naqueles tempos marcados pelo terror que incutia em todos a figura do famigerado cangaceiro, o que podia ter parecido uma bravata, foi um exemplo à posteridade de que um  Juiz  nunca deve render-se ao crime organizado nem intimidar-se diante dos poderosos. 

No pensar daquele Juiz era um malfeitor que precisava ser contido a todo custo em suas ações criminosas.

Por medo, jamais colocaria panos quentes sobre aquele caso que se deu em sua comarca. Portanto, Virgulino Ferreira, vulgo Lampião, merecia uma sentença penal condenatória exemplar.

Para aquele Juiz a lição espelhada pela frase “o crime não compensa” tinha que ser aprendida por quem se envolvesse em algum fato delituoso devidamente comprovado.  E, para ele,  as penas da lei não havia exceções ao proferir uma sentença. 

LAMPIÃO CIRCULAVA EM SERGIPE COM TRANQUILIDADE

Era voz corrente que o famoso bandido Lampião,  vez por outra aparecia circulando, sem ser importunado, por vários lugares do território sergipano. 

O “Rei do Cangaço” tinha uma vida mais tranquila em Sergipe, para onde costumava homiziar-se quando queria  livrar-se da implacável perseguição das volantes de Alagoas e Pernambuco. 

Essa relativa segurança de Lampião a cavalgar com sua trupe pelo território sergipano devia-se sobretudo à complacência do então governador Eronildes de Carvalho, com quem mantinha uma relação de amizade, conforme se comentava na época.

NO ENCALÇO DE LAMPIÃO E A CERTIDÃO DO OFICIAL DE JUSTIÇA 

No livro da autoria do professor da UFS, Valtenio Paes de  Oliveira (Diálogos de 1970), há  uma referência a essa histórica intimação, cuja certidão, com o seu conteúdo digitalizado, pode-se ler melhor a seguir: 

“Certidão
Certifico que em cumprimento do mandado retro fui ao Sítio Acenço deste termo e nesta cidade intimei todas as testemunhas constantes do mesmo mandado ficaram todas bem cientes deixando de intimar o denunciado do despacho Virgulino Ferreira conhecido por Lampião por não ter graças a Deus visitado esta cidade, indesejável fera …. a verdade do que dou.
Nossa Senhora das Dores, 26.12.1931
Oficial de justiça
Januário Bispo de Menezes”
Cópia constante no livro “Diálogos de 1970” de Valtenio Paes de Oliveira

Para cumprir a determinação advinda do Juiz da comarca, o oficial de justiça Januário Bispo de Menezes tentou achar o meliante para entregar-lhe a ousada intimação. Mas, segundo ele próprio declarou, deixara  de cumprir o mandado de intimidação “por não ter graças a Deus visitado esta cidade, indesejável fera …” .

Não sabemos se realmente o oficial de justiça andou mesmo sozinho atrás do sanguinário bandoleiro, como ele escreveu na certidão, nem se a polícia militar fora convocada pelo Juiz para dar cobertura à realização da diligência, nem se Lampião prometeu vingar-se do magistrado por causa do processo que este lhe movera.

O fato é que o desalmado fora da lei daí em diante não mais fez incursões com a sua cabroeira pelas bandas de Capela e Dores, por onde passara nos anos  de 1929 e 1930. 

Com a morte de Lampião, em 28 de julho de 1938 – que caiu numa emboscada na Grota de Angicos (Poço Redondo-SE) sob o comando do Tenente João Bezerra -, o processo contra ele foi extinto e arquivado. 

Foi, em verdade, o único processo criminal aberto contra Lampião em terras de Sergipe D’El Rei.  

Não há nenhum registro histórico que diga o contrário.

ACV