TANCREDO NEVES PRESIDENTE
Entre os anos de 1983 e 1984 surgiu no Brasil um movimento cívico-político pelo retorno às eleições diretas, quando foram organizados comícios gigantescos que expressavam com toda clareza a vontade da Nação em imprimir novos rumos à forma de escolha de seus representantes no Congresso e no Governo.
O processo de escolha de nossa representação popular então vigente, tinha o objetivo de manter a cada eleição o status quo do regime militar implantado em 64. Criara, dentre outros instrumentos autoritários, as eleições indiretas, o senador biônico, a sublegenda e o voto vinculado.
A emenda Dante de Oliveira desencadeou esse sentimento de mudança empolgando todo o Brasil.
Todavia, apesar da pressão popular exercida nas ruas e nos comícios populares pelas Diretas Já, a Câmara dos Deputados ainda com medo do regime militar agonizante, rejeitou a proposta de emenda à Constituição das Diretas Já.
A propositura conseguiu 298 votos, mas por não ter atingido o quorum exigido (320) foi arquivada pela Mesa da Câmara. Ausentaram-se do recinto da votação nada menos de 113 deputados, enquanto apenas 65 disseram não à proposta. Viu-se, pelo resultado que, mesmo na eleição indireta, se não houvesse um golpe, a oposição, impulsionada pelo sentimento popular de mudança, poderia dobrar o cabo da boa esperança e vencer o candidato do governo militar no Colégio Eleitoral.
O Colégio Eleitoral operava na União e nos Estados, elegendo, pelo processo indireto, Presidentes da República, Governadores e Senadores “Biônicos”.
Mas, pela primeira vez, com a criação da Frente Liberal formada por lideranças que romperam com o governo, surgiu uma possibilidade concreta de se eleger no próprio Colégio Eleitoral, até então intocável, um candidato a presidente das hostes da oposição.
Dentro desse quadro que sensibilizava toda a Nação, fui o primeiro político da ala governista no Estado de Sergipe a engrossar fileiras daquele movimento de restauração completa da democracia. Essa aliança, formada por lideranças de diversas correntes que lutavam pela mudança do regime, passou a ser intitulada de Aliança Democrática.
Exercendo o cargo de vice-governador de João Alves, tomei a iniciativa de ir a Belo Horizonte, para manifestar o meu apoio a Tancredo Neves, então governador de Minas, que tomara a decisão de se afastar do governo do Estado, no início de abril de 1985, para tentar viabilizar sua candidatura pelo processo indireto que fora imposto pelo regime discricionário durante mais de 20 anos. Essa posição que eu adotei em relação ao regime me colocou na marca da ascensão na política.
COM TANCREDO NEVES
O governador João Alves preferiu adotar a estratégia de permanecer governando sem manifestar apoio explícito a Tancredo nessa primeira hora, resguardando-se para em outra oportunidade definir sua posição quanto ao problema sucessório no Brasil.
Ele considerou a minha posição como gesto de coragem e de afirmação cívica. Era visível a alegria de Tancredo ao receber naquele momento o apoio de um vice-governador do Nordeste quando nada ainda estava definido em relação ao futuro do Brasil. Sem sabermos qual a reação dos militares diante de uma disputa política que se vislumbrava dentro do próprio Colégio Eleitoral criado pelo regime para se manter no poder. Falava-se até em golpe de Estado para conter o ímpeto de mudança que estava tomando conta do Brasil.
Quando cheguei em Belo Horizonte, tendo ao meu lado o ex-deputado federal e Secretário de Estado de Justiça Tertuliano Azevedo, lá encontrei me aguardando Jackson Barreto, Benédito Figueiredo e Rosalvo Alexandre. Todos felizes com a minha atitude de engajamento na luta pela restauração plena de nossa democracia. Fomos todos juntos ao encontro histórico com Tancredo Neves, para selarmos o acordo de apoio à sua candidatura à presidência.
A reunião aconteceu no Palácio das Mangabeiras, residência oficial do governador. Recordo-me, com emoção, a forma entusiástica como fui recebido pelo então governador Tancredo Neves, um dos símbolos da resistência ao regime militar, tribuno portentoso, uma figura admirável. Abraçou-me pronunciando palavras para todos ouvirem de agradecimento pelo meu gesto de apoio.
BANDEIRAS VERMELHAS
Aquele apoio, na primeira hora, à candidatura de Tancredo significou um passo da maior importância para minha futura candidatura ao governo do Estado. Facilitou, sem dúvida alguma, a somação, em torno do meu nome, das chamadas forças progressistas, (partidos de esquerda: PSB, PCdoB e PC) ), que, motivadas, subiram no meu palanque, ergueram suas bandeiras vermelhas nos nossos comícios e passeatas durante a campanha para o governo do Estado, em 1986. Essas forças lutaram bravamente pela minha vitória.
No início da campanha comecei nas pesquisas com 7%, e ao seu final, uma vitória insofismável, com uma diferença de mais de 50 mil votos.
ANTES, CAMPANHA DE PREFEITO EM ARACAJU
Em 1985, realizaram-se as eleições municipais nas capitais cujos Prefeitos anteriormente eram nomeados pelo governador.
Fui o coordenador político da campanha que levou Jackson Barreto à Prefeitura de Aracaju. Teve uma vitória indiscutível, derrotando o candidato dos Franco, Gilton Garcia, por uma larga margem de votos.
Gilton fora um Deputado estadual muito atuante. Cassado injustamente pela ditadura, passou alguns anos fora da política cuidando de sua banca de advocacia, e pretendia retornar à vida política como prefeito da capital. O meu amigo Gilton Garcia, ex-UDN, como meu pai, filho de um governador pacífico e trabalhador, reapareceu na hora errada, justamente quando surgia um novo ciclo da política em nosso Estado e um novo agrupamento político, sob o comando do governador João Alves Filho, no qual eu e Jackson Barreto estávamos inseridos e crescendo.
A SUCESSÃO DE JOÃO ALVES, PEDRAS NO CAMINHO
No início de 1986 a sucessão estadual, puxada pelo MDB já começava a ser discutida. José Carlos Teixeira, presidente do partido, que fora nomeado, pelo Governador João Alves, em 1985, para exercer o cargo de prefeito indireto de Aracaju, em substituição ao Prefeito Heráclito Rollemberg que também alimentava o desejo de entrar na disputa sucessória.
Até às vésperas da escolha do candidato, eu preferia, pessoalmente, não concorrer ao cargo de governador, e, sim – já que eu exercia o cargo de Vice-Governador – substituir o titular, no caso de uma natural candidatura de João Alves a Senador da República.
Aconteceu que o PFL, que detinha o comando do Estado, não aceitava em nenhuma hipótese candidato de outro partido para sucessão governamental.
Na tentativa de resolver a sucessão de forma pacífica, sem brigas ou dissidências, o governador João Alves promoveu uma reunião no Palácio Olimpio Campos, da qual resultou um documento assinado por todos os presentes. Esse documento delegava ao Governador João Alves e ao Prefeito Jackson Barreto a indicação do candidato a Governador. Estando presente àquela reunião, anotei que dela também participaram, além do Governador e do Prefeito, José Carlos Teixeira, Seixas Dórea e Benedito Figueiredo.
ZÉ CARLOS ROMPE ACORDO
VIRA A MESA E EMBOLA A SUCESSÃO
No dia seguinte, mesmo diante do compromisso assinado, José Carlos já anunciava o rompimento do acordo político. Começou a telefonar pela madrugada a dentro avisando a seus correligionários.
A corda esticou de tal modo que, dentro em pouco os dois partidos maiores do Estado, PFL e MDB, estavam em lados opostos.
Para unir totalmente o MDB contra nós, só faltava que José Carlos Teixeira – que já tinha o apoio explícito dos Franco -, aceitasse o nome de Benedito Figueiredo para vice-governador na sua chapa. A indicação de Benedito partira do Prefeito de Aracaju, Jackson Barreto, a estrela política sergipana em ascensão.
Pra decidir quem seria o vice, foi realizada na Assembléia Legislativa do Estado, no antigo Palácio Fausto Cardoso, uma reunião dos delegados e das lideranças do MDB. A convenção do MDB, ajudou-me a articular o apoio de JB, cujo candidato a vice-governador foi rejeitado pelos delegados, e a escolha do nome para ser companheiro de chapa de José Carlos, recaiu no preferido dos Franco, o ex-Senador Passos Porto, um homem de bem, porém, representativo da oligarquia que se queria derrubar.
Sabendo da insatisfação de Jackson e Benedito com a decisão do PMDB, depois de combinar com o governador João Alves – o qual já havia me confidenciado que não sairia do governo – procurei a ambos e ofereci-lhes a vice na nossa chapa. O convite foi aceito imediatamente. O prefeito Jackson Benedito, preterido pelo seu partido na indicação do vice, apontou o nome de Benedito Figueiredo, integrante do PSB, para compor a nossa chapa majoritária. O nome de Benedito foi aceito sem restrições.
Jackson e o seu grupo, haviam pedido desfiliação do MDB. Conseguimos dividir o MDB ao meio, e, com isso, enfraquecer a candidatura de José Carlos Teixeira.
A VITÓRIA DO POVO
Criado o cenário favorável à minha candidatura, disputei a eleição, enfrentando o poder econômico e político da família Franco e da família Teixeira, as mais poderosas do Estado.
Ganhei na Capital e no interior com mais de 50 mil votos de frente. Foi uma campanha inesquecível.
Da coligação que me elegeu participaram, além do PFL, que era o meu partido, o PSB, o PCB e o PCdoB.
O MDB de José Carlos Teixeira ganhou as eleições pra governador em todos os Estados brasileiros, menos no estado de Sergipe.
Fui eleito governador aos 43 anos de idade. Um filho de plantador de algodão do Povoado Pau de Leite, do município de Simão Dias, chega ao governo pela vontade soberana do povo sergipano.
Leia no próximo capítulo, “O Negão Ganha o Governo”