NA ESCOLA DE QUÍMICA UMA REFERÊNCIA NO BRASIL
Passei no vestibular da Escola de Química Industrial, que funcionava em prédios localizados nas imediações do Estádio de Aracaju, hoje Batistão. Tratava-se de uma escola respeitada em todo o Brasil. O seu diploma era um passaporte para um bom emprego, principalmente na PETROBRAS.
Em função do prestígio e da fama da Escola de Química, seus alunos eram comumente convocados por instituições públicas ou privadas para suprir as deficiências de seus quadros em disciplinas do campo de exatas como química, matemática e física. Foi desse modo que, no segundo ano de faculdade terminei sendo professor por um período de três anos, antes de me formar, ministrando as disciplinas matemática e física no Atheneu, colégio onde estudei, e completei o meu curso científico.
Estudava e trabalhava para pagar a pensão de D. Helena, na rua de Pacatuba. Em frente a essa pensão morava uma bela garota com a qual mantinha uma paixão platônica. Era um apaixonado e essa garota nunca soube. A timidez impedia de me declarar. Ficava aguardando a sua saída para o Colégio, e só saia da janela quando a sua silhueta desaparecia da minha vista …
Ingressei na militância da política estudantil. Fui eleito presidente do Diretório da Faculdade de Química. Montei um jornal que, dentre outras matérias, trazia novidades e artigos sobre a profissão do Químico Industrial. Passei uns tempos fazendo estágio profissional na Refinaria Landulpho Alves, na Bahia.
VITÓRIA PARA PREFEITO
No último ano de faculdade, fui eleito Prefeito Municipal de Simão Dias, aos 22 anos de idade. Ficava entre Aracaju e Simão Dias, com muito esforço terminando o curso da faculdade e administrando o município. Quando as aulas na faculdade estavam apertando, o meu vice-prefeito Dermeval Guerra quebrava um galho e me substituía na função de prefeito municipal com muito zelo e lealdade. No final do ano, ao receber o meu diploma de Químico Industrial, fui homenageado pelos meus colegas, que me entregaram a missão honrosa de ser o orador da turma, cuja colação de grau se deu no recinto do Teatro Atheneu, contando com a presença do governador Lourival Batista.
O TOSTÃO CONTRA O MILHÃO
Quando eu exercia o mandato de prefeito, governava Sergipe doutor Lourival Baptista, em cujo período não tivemos uma boa parceria administrativa, possivelmente por motivos de natureza política. Mas em outras etapas de nossas vidas políticas passamos a ter um ótimo relacionamento. Um figura sábia, esperta e dedicada da lista de grandes políticos de nosso estado. Apoiado pelo regime militar Lourival fez um governo realizador, e, em termos de rodovias foi um dos melhores governadores. Foi de sua iniciativa a construção da rodovia asfaltada entre a BR 101 e a cidade de Simão Dias.
A eleição municipal que me conduziu à prefeitura de Simão Dias foi uma das mais disputadas entre aquelas que vivenciei em toda a minha carreira política. Lauro Nascimento, meu adversário, contava com o apoio de todas as forças políticas e econômicas tradicionais do município, inclusive do governador do Estado, filho de Simão Dias, Sebastião Celso de Carvalho e do prefeito Nelson Pinto de Mendonça. Foi uma grande reviravolta na política local, um jovem com 22 anos de idade, conseguir vencer uma estrutura político-partidária fortíssima.
Enfrentei, com muita coragem e dedicação o desafio de lutar por uma mudança nos rumos da administração e da política do município sem saber, por antecipação, qual seria o resultado, e qual seria o meu destino, caso perdesse a eleição. Os analistas políticos do Estado diziam que não havia como o filho de Pedro Valadares ganhar aquela eleição. Nos comícios eu sempre terminava os meus discursos em tom de luta heróica : “Por isso eu digo ao meu povo, essa é a batalha do tostão contra o milhão!).
Caso o nosso projeto político não lograsse êxito, possivelmente iria me dedicar às minha profissão de químico na Petrobras, ou em alguma empresa privada no sul do país, deixando de existir como político. Com 353 votos de frente derrubei o tradicionalismo, ou melhor dizendo, as oligarquias de Simão Dias. A figura de Pedro Valadares, meu pai (que havia falecido há dois anos atrás), e a presença constante de D Caçula e Zé Valadares, este já exercendo o mandato de deputado estadual, tiveram influência decisiva naquela virada histórica, uma jornada realmente emocionante (na foto, posse na Câmara de Vereadores).
ADMINISTRAÇÃO E POLÍTICA
Em 1967, quando iniciei o meu mandato de prefeito minhas prioridades: educação e saúde. Abri escolas nos povoados mais distantes; levei para servir ao município uma instituição federal de saúde muito requisitada na época, a Fundação SESP. Certa vez, olhei para a avenida Coronel Loyola, na época porta de entrada da cidade – que tinha uma pavimentação ultrapassada, de pedras brutas, um grande desafio – e disse pra mim: “se eu puder, será a primeira obra, colocar ali paralelepípedos”. Fiz a obra. Pavimentei quase toda a cidade. Nenhum calçamento era feito sem esgoto. Construí o primeiro conjunto habitacional da cidade, de cem casas. Fiz escolas, estradas, pontes e postos de saúde.
A política municipal só era quente no período da eleição. Nós éramos chamados de Crocodilos, enquanto que os nossos adversários, sob o comando do ex-Governador Celso Carvalho, eram os Jacarés. Duro no embate eleitoral, experiente, elegante, educado, o doutor Celso, se retirava quase por completo dos atritos do dia a dia logo após o resultado do pleito, quando o seu grupo perdia a eleição. Era luta entre dois grupos políticos que disputavam a preferência do eleitorado e , ao longo do tempo, se alternavam no comando da prefeitura. A paz existia de verdade, nem ameaças, nem perseguições, só se gastava língua e saliva, rolavam buxixos, é bem verdade, mas nunca houve violência para conter o crescimento do outro. Por essa razão é que Simão Dias era conhecida como a Suiça Sergipana.
O BARÃO DO MERCADOR
O avô de Celso Carvalho, pelo lado materno, provinha de Sebastião de Andrade, o Barão de Santa Rosa, e pelo lado paterno, tinha parentesco com Joviniano de Carvalho, que foi, na República, várias vezes deputado federal no início do século XX. Por isso, para expor sua origem nobre eu o cutucava nos comícios chamando-o de Barão do Mercador (Mercador , nome da fazenda de Celso). Mas ele ficava irritado só um pouco com minhas provocações, respondia nos comícios, alteando a voz, que tinha orgulho de sua descendência, e discorria sobre a árvore genealógica de sua família de barões e baronesas…
Em muitas oportunidades, confesso que aprontei muitas armadilhas e criei sérias dificuldades em todas as eleições para o Dr Celso, deixando-o preocupado e vigiando os meus passos. Ele despertava uma verdadeira paixão entre seus aliados pela persistência e interesse na política, despendendo recursos que, por certo, lhe causaram muitas despesas e prejuízos financeiros.
Certa vez, por uma dessas distorções da política então vigente, chegamos a pertencer a um mesmo partido, a ARENA. A sublegenda se encarregava de fazer a separação política dos dois grupos. Foi aí que resolvi preparar-lhe um golpe político, um verdadeiro cheque-mate, que expôs com todas as letras a fragilidade e o artificialismo do sistema eleitoral que adotara a sublegenda. Já que ele estava na mesma agremiação política que a nossa – só pela conveniência de colocar-se debaixo do guarda-chuva do governo – e como, pela própria rivalidade local, era impossível o diálogo, cheguei à conclusão de que numa situação esdrúxula como aquela, quem fosse o mais forte, internamente, é que tinha que dar as cartas. E o nosso grupo dentro daquele quadro partidário confuso, era o mais forte para o azar de Celso.
Por seus projetos de conveniências políticas deixou-se encurralar pelo seu adversário que mantinha segura a chave do partido. Nenhum político espere pela benevolência de seu adversário quando este detém o poder de comando para decidir uma questão partidária.
A SUPREMACIA DO DIREITO DA MAIORIA: CANDIDATO ÚNICO
Veja como tirei Celso de Carvalho de campo naquela partida. Vou contar como foi. Na eleição municipal de 1970, como o nosso grupo tinha maioria no diretório do partido, simplesmente obedeci à risca o que mandava a legislação: apresentei no Cartório Eleitoral a chapa completa do nosso grupo, onde constavam os nomes dos candidatos a Prefeito, a Vice e Vereadores. Celso só poderia ter a sua própria chapa se o nosso diretório a apresentasse. Ora, veja se isso poderia ser fácil! O radicalismo político entre os dois grupos na época era muito grande, afastava as pessoas, criava inimizade entre as famílias, traduzindo em miúdos, o óleo não se mistura com a água.
O próprio governador, Lourival Baptista entrou em ação, convocando-me para uma conversa no Palácio Olímpio Campos, fazendo toda pressão possível, insinuando até que os militares poderiam reconduzi-lo ao governo, permitindo a reeleição de mandatos de executivos. Foi em vão todo esse trabalho de convencimento: naquela eleição o grupo de Celso Carvalho ficou de fora. Não apresentou sequer um candidato a Vereador.
Recebi pressões de todos os lados para que eu registrasse também a chapa dos adversários. Eu entendia que se queriam disputar a eleição, tinham que fazê-lo se filiando a um partido de oposição (MDB), mas com a minha caneta jamais eu poderia contribuir para o trucidamento, para a divisão pública do nosso município, facilitando a vida do adversário que não queria largar o osso do governo, enquanto queria derrubar o nosso grupo … Eu desejava dar um ponto final nessa verdadeira contrafação da política, de você ser obrigado a dormir com o inimigo, e ainda lhe dar a faca para ser ferido depois.
Não imaginem como o nosso grupo comemorou a peça que pregamos nos adversários… (na foto, ex-governador Celso de Carvalho).
FOI UM PRÊMIO JUSTO A UM SERVIDOR DO POVO
Na eleição municipal de 1970 o povo de Simão Dias votou para Prefeito no candidato único José Neves da Costa, vereador de muitos mandatos. Tinha um verdadeiro computador em sua memória, sabia pelo nome e sobrenome, onde morava um eleitor, e a que família pertencia. Um homem simples, pobre e honrado. A sua indicação foi a coisa mais justa que poderia ter acontecido. Um justo prêmio a um amigo incondicional não apenas de nossa política, acima de tudo, um servidor do nosso povo. Simão Dias muita devia ao velho Zé Neves. Fez uma excelente administração, o seu mandato durou apenas dois anos, cumpriu com o povo além do que prometeu em campanha. Governou com simplicidade e correção. Contribuiu com a sua ação administrativa e política para a eleição do seu sucessor, José Matos Valadares.
Anos após, assim que cheguei ao governo do Estado, procurei afastar as antigas divergências com doutor Celso e o seu grupo político. Estendi o tapete da conciliação e consegui afastar as rivalidades e mágoas geradas na luta e na fricção política entre Crocodilos e Jacarés. No poder, entendia que tinha de ser magnânimo